O dentista olha para o interior da boca do paciente e abana a cabeça, com uma careta. "Acho que teremos de extrair. A lesão se espalhou por todo o dente".
"Arrrgh", responde o paciente, segurando com mais força os braços da cadeira.
"Não se preocupe. Nossos registros nos informam que o senhor tem um depósito de células-tronco conosco. Um dente novo estará pronto rapidamente. Marque uma consulta para colocar o seu dente quando sair. Digamos daqui a dez semanas".
Quando mencionamos bioengenharia, a última coisa em que as pessoas pensam são dentes. Órgãos vitais como o fígado, os rins ou o coração - os que matam o paciente caso deixem de funcionar, são uma coisa. Mas, dentes?
Alguns poucos grupos de pesquisadores acreditam que, no momento, a odontologia apresente alguns dos desenvolvimentos mais animadores na área da bioengenharia. E talvez demore apenas dez anos para que uma variação da cena descrita acima seja executada de verdade nas cadeiras dos dentistas, calcula Paul Sharpe, diretor de desenvolvimento craniofacial no King's College de Londres. "O objetivo é que, quando você for ao dentista, tenha células extraídas e trabalhadas por engenharia genética", diz. "Depois, as inserimos no lugar onde você precisa de um dente e logo um dente novo cresce".
Em um mundo cheio de abalos e sem cura absoluta para a decadência dentária, haverá sempre dentes precisando de substituição. Mas, encaremos os fatos: as opções disponíveis são menos que ideais. Dentaduras são desconfortáveis, canhestras e inconvenientes. Implantes de titânio de última geração implicam em trabalho odontológico pesado e sangrento, e ainda assim não são exatamente como dentes reais. Já está mais que na hora de surgirem alternativas melhores.
A bioengenharia avançou bastante nos últimos anos, e com isso surgiu a possibilidade de criar órgãos do zero. Os dentes são um alvo atraente para os bioengenheiros. Eles não mantêm as pessoas vivas, como o fígado e o coração, de modo que se um dente não crescesse de maneira correta, o dentista poderia simplesmente extraí-lo e começar de novo -algo bem menos temerário do que implantar um fígado criado por engenharia genética e vê-lo deixando de funcionar. Além disso, chegar ao local do implante não requer uma cirurgia de grande porte -apenas o familiar "abra bem a boca". De fato, alguns pesquisadores acreditam que os dentes tenham sido negligenciados de maneira insensata, em comparação com os esforços de criar órgãos mais "glamorosos" por engenharia genética.
E existe uma boa chance de que a vaidade humana garanta um suprimento constante de dinheiro para a pesquisa necessária. O imenso mercado norte-americano de odontologia cosmética testemunha o anseio de pelo menos um país pelo sorriso perfeito. As empresas de biotecnologia já estão salivando diante da idéia de conquistar uma fatia dessa torta multibilionária. Os fundadores da Dentigenix, uma empresa norte-americana criada em novembro, planejam adquirir licenças para técnicas desenvolvidas por outros pesquisadores que trabalham com reparos dentários e regeneração de dentes integrais. O executivo chefe do grupo, Christopher Somogyi, que costumava trabalhar no ramo de capital para empreendimentos biotecnológicos, diz que a "revolução na engenharia de tecidos que temos na medicina ainda não avançou de maneira equivalente na odontologia. Nas conferências, quando um cardiologista entra na sala, toda a atenção é dedicada a ele". Mas, acrescenta, "o número imenso de procedimentos potenciais" faz da odontologia uma área ideal de investimento.
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